sexta-feira, 20 de julho de 2012

Era uma vez um político...


     O post de hoje é um dos textos publicados na 5ª edição do jornal O Manifesto, escrito pelo nosso parceiro Tulio Fernando. Em ano político e diante do atual quadro político em que nosso estado de Goiás se encontra o texto é bem sugestivo, pois segundo Berthold Brecht "da sua ignorância política nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e o lacaio das empresas nacionais e multinacionais". O texto é muito bacana vale a pena ler!!

Era uma vez, um José
   

Era uma vez um político. O nome dele era José. Mas ele não era só mais um político. Ele era “O político”. Já havia sido reeleito diversas vezes em sua cidade para ocupar seu cargo público, nada parecia afetar sua sólida carreira. Seu partido já havia se estabelecido como o grande mandante, não só na cidade de José o político, mas em todo o estado. Porém, um dia uma terrível tragédia aconteceu. Fora descoberta a outra face de José o político. De repente, várias denúncias surgiram contra José o político, fraudes, propinas, corrupção, roubo, desvio de verbas, até um caso de estupro. Um verdadeiro escândalo. José o político foi indiciado e preso, mas, foi por pouco tempo. A polícia refutou as provas que existiam contra ele - não são o suficiente! Alegavam. Então, o soltaram no mesmo dia, para responder o processo em liberdade. Graças toda a burocracia que infesta o sistema penal e devora toda verdade como uma traça, e graças a um arquivista distraído que teve a presteza de “sumir” as provas contra José o político, ele não foi condenado. Com o passar do tempo, as pessoas nem se lembravam mais do escândalo. José o político, se aposentou da vida pública, mas, não ficou abandonado a própria sorte, recebia aposentadoria por seus inestimáveis serviços prestados a comunidade e viveu feliz para sempre. Do estupro não se ouviu mais falar.
   Era uma vez um advogado. O nome dele era José. Mas ele não era só mais um advogado. Ele era “O advogado”. Nunca perdera um único caso em toda a sua vida como jurista. Austero em seus princípios. Era conhecido, sobretudo, pela oratória impecável e pela atitude abnegada com a qual defendia seus clientes. Gente da alta, da classe A, da elite, políticos, empresários, fazendeiros. Porém, um dia uma terrível tragédia aconteceu. Fora descoberta a outra face de José o advogado.  De repente, várias denúncias surgiram contra José o advogado, subornos, corrupção, estelionato, assassinato, fraudes, até um caso de pederastia. Um verdadeiro escândalo. José o advogado foi indiciado e preso. Mas, seus clientes não o abandonaram, gente da alta sociedade, que eram cheios do dinheiro, moveram céus e terras para socorrer o pobre José o advogado. Curiosamente, as denúncias não puderam ser comprovadas. José o advogado, foi solto em pouco tempo por insuficiência de provas. Até o caso de pederastia foi esquecido. José o advogado não podia mais exercer advocacia, mas, não ficou desamparado pobrezinho, seus amigos da classe A, o arranjaram um bom emprego na capital, onde poderia fazer muitos “servicinhos” convenientes. Com o passar do tempo, as pessoas nem se lembravam mais do escândalo. Um belo dia, foi até homenageado em sessão pública solene por suas inestimáveis habilidades como, causídico, e viveu feliz para sempre.
    Era uma vez um empresário. O nome dele era José. Mas ele não era só um empresário. Ele era “O empresário”. Fizera de sua empresa a maior da região. Faturava milhões e milhões com seu jeito ousado de fazer negócios, e por ser um melindroso empreendedor. Porém, um dia uma terrível tragédia aconteceu. Fora descoberta a outra face de José o empresário. Várias denúncias foram dirigidas contra ele, falsidade ideológica, exploração, sonegação de impostos, corrupção. Até um caso de assédio sexual e outro de pedofilia. José o empresário foi indiciado e preso, mas foi por pouco tempo. José o empresário tinha muitos amigos na política, além, de um destemido advogado, indômito ao exigir a justiça e evocar a constituição. As denúncias foram rechaçadas, não foram encontradas provas suficientes para incriminá-lo, e curiosamente os delatores de seus crimes revelaram estar enganados, e que não se tratava deste José, mas, sim de outro qualquer. Assim, a justiça o liberou, pode voltar a exercer seu oficio com destemida devoção. Com o passar do tempo, as pessoas nem se lembravam mais do escândalo. Um belo dia, foi até condecorado com a medalha do mérito legislativo por seu dinamismo empresarial.  E viveu feliz para sempre.
    Era uma vez um lavador de chão. O nome dele era José. Mas ele não era só um lavador de chão. Ele era “O lavador de chão”. Nunca se vira na face deste mundo guerreiro de vassoura e rodo na mão com habilidade comparável a de José o lavador de chão. Destacava-se na empresa onde trabalhava, lavando o dobro das salas que os outros lavadores e em metade do tempo que os outros gastavam. Pai de família sem igual pagava com muito custo um curso de língua estrangeira para o filho mais novo e acalentava sonhos ambiciosos para o filho mais velho. A filha impúbere tinha a descomunal habilidade da leitura, além de ajudar nas tarefas de casa. Um dia, José o lavador de chão, estava assistindo o jornal, e entre as notícias do esporte e a previsão do tempo, viu que um conhecido político de sua cidade, foi preso, acusado de vários crimes, mas, por não haver provas suficientes haviam-no soltado. José o lavador de chão não se aguentou. Aquele político se apoderou do dinheiro dele, o dinheiro dos impostos que pagava, portanto, aquela situação não ficaria assim. José o lavador de chão, reuniu alguns outros moradores e foram protestar na rua. Sua filha dissera que segundo uma tal constituição, tinham o direito de exercer sua cidadania. E foi o que fizeram, mas, uma terrível tragédia aconteceu. José o lavador de chão foi preso, acusado de perturbação da ordem. Não foi tudo, o político o acusou de uma série de crimes, até de estupro. O advogado que defendia o político o processou por desacato a autoridade, e por ser um pederasta enrustido. O dono da empresa onde ele trabalhava o despediu por justa causa, e disse que não queria pedófilos trabalhando em sua empresa, e ainda, teve a audácia de dizer que José o lavador de chão, nem era tão bom empregado assim. Um verdadeiro escândalo, as pessoas nunca se esqueceram de José o lavador de chão e do quão vil era o seu caráter.
   Afinal, a justiça é igual para todos (é?), e ela foi feita (foi?), José o lavador de chão foi condenado por ser um terrível criminoso (e era?), sem direito a fiança, teve de cumprir a pena em regime fechado, e sua família... Não viveu feliz para sempre.  

2 comentários:

  1. muito bom retrata o que realmente acontece.

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  2. Eu prefiro nem comentar... qualquer acrescimo seria desnecessario ao texto...

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